Um ano depois da invasão à Ucrânia, que deixou milhares de mortos, presidente russo afirmou que continua determinado a continuar ofensiva

O presidente russo, Vladimir Putin, acusou nesta terça-feira os países ocidentais de usar o conflito na Ucrânia para "acabar" com a Rússia e os responsabilizou pela escalada, em seu discurso anual à nação, três dias antes do primeiro aniversário da ofensiva na Ucrânia. 

No discurso, o presidente ainda anunciou que Moscou suspendeu sua participação no tratado de desarmamento nuclear Novo Start, último acordo deste tipo com os Estados Unidos, e ameaçou realizar novos testes nucleares se os EUA os fizessem primeiro.

— As elites do Ocidente não escondem seu objetivo: infligir uma derrota estratégica à Rússia, ou seja, acabar conosco de uma vez por todas — disse, acusando o Ocidente de apoiar forças "neonazistas" na Ucrânia para consolidar um Estado anti-russo. — A responsabilidade por alimentar o conflito ucraniano, por sua escalada, pelo número de vítimas recai inteiramente sobre as elites ocidentais.

A suspensão da participação russa no tratado nuclear é a ruptura mais acentuada de Moscou com o Ocidente até agora. O anúncio acontece poucas horas antes de um discurso do presidente americano, Joe Biden, que visitou de surpresa a capital ucraniana, no domingo, e prometeu mais US$ 500 milhões em ajuda ao país em sua ofensiva contra a Rússia.

Putin enfatizou, no entanto, que a Rússia não está saindo definitivamente do acordo. O novo Start limita a Rússia e os Estados Unidos a 1.550 armas nucleares implantadas. Ao interromper a participação no tratado, que expira em fevereiro de 2026, Putin pode exceder esse limite, ou acabar com a capacidade dos EUA de monitoramento.

— Antes de voltar à discussão desta questão, devemos entender por nós mesmos o que países da aliança do Atlântico Norte, como a França e o Reino Unido, possuem em seus arsenais estratégicos.

Horas depois, no entanto, o ministério das Relações Exteriores da Rússia garantiu que o país continuaria a cumprir os limites que impõe ao tratado até que ele expire, em 2026.

Após o anúncio, Jens Stoltenberg, secretário-geral da Otan, disse que “lamentava” a decisão da Rússia, dizendo que isso significa que “toda a arquitetura de controle de armas foi desmantelada”.

— Encorajo fortemente a Rússia a reconsiderar sua decisão e respeitar os acordos existentes.

Ao longo de quase duas horas, o chefe de Estado garantiu que a Rússia atingirá seus objetivos na Ucrânia, voltou a acusar o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, de encabeçar um regime "neonazista" e denunciou que Kiev queria se armar com bombas nucleares.

— Não tínhamos dúvidas de que eles tinham operações prontas para o Donbass em fevereiro [de 2022]. Eles fizeram a guerra começar, nós apenas usamos a força para frear a guerra — justificou Putin, que se disse determinado a continuar a guerra. — Vamos resolver passo a passo, cuidadosa e sistematicamente, os objetivos diante de nós.

Diante da elite política do país e dos militares que lutaram na Ucrânia, o presidente também agradeceu "a todo o povo russo por sua coragem e determinação". Putin ainda saudou a resiliência da economia russa, apesar das sanções internacionais. 

O PIB da Rússia contraiu 2,1% em 2022, segundo dados publicados na segunda-feira, longe das previsões muito mais negativas de há alguns meses. O FMI antecipa agora um ligeiro crescimento, +0,3%, para 2023.

— O objetivo do nosso trabalho não é nos adaptar às condições atuais. A tarefa estratégica é levar nossa economia a novas fronteiras — disse o presidente russo, destacando os ocidentais "não alcançaram nada e não alcançarão nada". — Garantimos a estabilidade da situação econômica, protegemos os cidadãos.

Ainda atacando o Ocidente, Putin disse que a pedofilia se tornou a "norma":

— Veja o que eles fazem com seu próprio povo: a destruição de famílias, de identidades culturais e nacionais, perversão e abuso infantil, até mesmo pedofilia, são declarados a norma — afirmou.

Logo após o término do discurso, a Ucrânia prometeu "expulsar e punir" a Rússia. "Eles estão estrategicamente em um beco sem saída", disse o chefe da administração presidencial da Ucrânia, Andrey Yermak, no Telegram.

Já o conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, Jake Sullivan, chamou as acusações de Putin de "absurdas".

— Ninguém está atacando a Rússia. É absurdo pensar que a Rússia estava sob qualquer tipo de ameaça militar da Ucrânia ou de qualquer outro país — disse.

Nesta terça, Biden pretende fazer um apelo para que as democracias do mundo continuem se posicionando contra a agressão da Rússia na Ucrânia como parte de um amplo esforço para defender o princípio da liberdade. 

O presidente americano fará seus comentários no Palácio Real de Varsóvia, onde falou há quase um ano, quando a Rússia iniciou sua invasão da Ucrânia.

— Seus comentários se referirão especificamente ao conflito na Ucrânia, mas, é claro, também falarão sobre a luta mais ampla entre (de um lado) agressores tentando destruir princípios fundamentais e (de outro) democracias se unindo para tentar respeitar esses princípios — acrescentou Sullivan.


Fonte: O GLOBO