Equipe econômica espera reduzir despesas com juros para ajudar no reequilíbrio das contas públicas
O novo arcabouço fiscal proposto pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é uma regra de controle das contas públicas proposto para substituir o atual teto de gastos, que limita o crescimento das despesas à inflação.
A nova regra vai prever uma banda para o crescimento real das despesas primárias, ou seja, tudo o que é gasto pelo governo sem contar o pagamento de juros.
O teto de gastos limita o crescimento das despesas à inflação. Pela nova regra, as despesas sempre vão crescer acima da inflação, independentemente do cenário.
Juliana Inhasz, professora de economia do Insper, diz que a estimativa só será alcançada se tudo certo, não só com o novo arcabouço, mas com uma série de outras medidas que precisarão ser implementadas pelo governo federal e o Congresso.
— É um checklist muito extenso. No final do dia, essa projeção só vai se realizar se tudo der muito certo. Isto inclui a aprovação da reforma tributária, com ganho de receita expressivo; crescimento econômico; e mesmo os votos necessários para aprovar as medidas sem precisar abrir mão de orçamento com emendas. Além disso, precisaria que o cenário internacional ajudasse também — diz Inhasz.
Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, calcula que, para o governo economizar R$ 360 bilhões com juros da dívida pública, a taxa básica de juros, a Selic, precisaria cair dos atuais 13,75% ao ano para 4% ao ano em 2031. No cenário apurado pelo Banco Central, a taxa básica de juros cai para 10% em 2024 e posteriormente fica em 9% em 2025 e 2016.
— Essa questão do pagamento de juros está atrelada não só ao que foi indicado pelo arcabouço, mas a todo esse conjunto de medidas que o Ministério anunciou desde janeiro — analisa Matheus Pizzani, economista da CM Capital.
A conta de juros do governo federal, estados, municípios e empresas ficou no valor de R$ 64,153 bilhões em fevereiro de 2023. Mais que o dobro do total de fevereiro de 2022, de R$ 26,016 bilhões. Essa alta reflete principalmente o forte aumento da Selic pelo Banco Central, que saltou de 2% para 13,75% desde janeiro de 2021.
O secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, explicou que a simulação de uma economia de R$ 360 bilhões considera uma queda média de 1 ponto percentual em toda a "curva de juros", ou seja, nos contratos negociados pelo mercado com vencimentos mais curtos e mais longos.
— A projeção mostra o quanto tem de efeito positivo se a gente criar estabilidade e tirar um pouco de ruído da curva de juros. Se a gente fizer isso, conseguimos economizar quase R$ 400 bilhões, o que representa mais do que o país investiu nos últimos 10 anos — disse.
Quando o endividamento do governo aumenta, a projeção de juros futuros tende a subir, porque há mais risco. No desenho fiscal apresentado pelo Ministério da Fazenda, o objetivo é estabilizar a dívida pública em relação ao PIB e traçar uma trajetória de redução. Com um menor risco, o governo pode se financiar com taxas mais baixas.
Selic não deve cair no curto prazo
O economista André Perfeito, todavia, explica um cenário que pode ajudar o governo nesse processo: o fato de a taxa Selic não ter perspectiva de redução no curto prazo não necessariamente impede uma eventual redução nos juros futuros. Nesse caso, se o plano fiscal apresentado pelo governo tiver efeitos práticos positivos, os juros mais longos podem cair.
— A Selic coordena uma parte da curva de juros. O Tesouro emite dívida com vencimentos de vários tipos, não necessariamente mais curto. São metas ousadas e há muitas variáveis. Agora, até segunda ordem, está bem encaminhado, há um plano fiscal que pode se encaminhar — analisa.
A Selic, porém, continua tendo um papel significativo. O Banco Central estima que para cada elevação de 1 ponto da Selic, mantida por 12 meses, há alta de 0,38 ponto da dívida bruta do país, ou R$ 38,6 bilhões. Os dados mais recentes indicam uma dívida de 73% em relação ao PIB.
Ao mostrar um controle efetivo nas contas públicas, o governo também espera resgatar o chamado “grau de investimento”, que foi alcançado no país pela primeira vez em 2008, no segundo mandato de Lula. As agências de risco Standard & Poor’s, Fitch e Moody’s retiraram este “selo” entre 2015 e 2016, diante do cenário fiscal do país na época.
— Se o arcabouço for suficiente para atingir os objetivos apresentados, se o cenário internacional e doméstico de inflação, juros e crescimento econômico se alinhar e for favorável ao Brasil, talvez no final de 2026 o Brasil consiga atingir o grau de investimento. Acreditamos, porém, que é difícil. Não é só matemática. O cenário econômico muda conforme o cenário doméstico e internacional — cita Alex Agostini.
Fonte: O GLOBO
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