Projeto foi votado pela Casa Alta do Congresso americano um dia após ser aprovado na Câmara de maioria republicana; EUA poderia entrar em default se projeto não fosse aprovado antes do dia 5 de junho

O Senado dos Estados Unidos aprovou, na noite desta quinta-feira, o acordo costurado por republicanos e democratas nas últimas semanas para suspender o limite do endividamento do governo federal, que ameaçava o país com a sombra de um calote federal pela primeira vez na História. O projeto de lei, que recebeu 63 votos a favor e 36 contra, segue agora para sanção presidencial de Joe Biden.

O projeto aprovado um dia antes na Câmara foi colocado para votação e aprovado pelo Senado, que tinha pressa em solucionar a situação, postergada por semanas enquanto o presidente da Câmara, o republicano Kevin McCarthy, pressionava os negociadores de Biden para conseguir concessões no projeto democrata, e torná-lo palatável para uma maioria da base republicana na Casa.

A proposta foi colocada para votação após uma série de reuniões a portas fechadas durante a tarde, para resolver uma disputa de última hora sobre o financiamento do Pentágono. À noite, funcionários do Senado e o senador Lindsey Graham, o republicano da Carolina do Sul que havia sido um dos principais críticos dos níveis de gastos com o departamento, disseram que os líderes de ambos os partidos negociaram uma linguagem que tranquilizou a ele e a outros falcões da Defesa o suficiente para apoiar o projeto de lei, abrindo caminho para a votação final.

— Isso não corrige esse projeto de lei totalmente, mas é um passo na direção certa — disse Graham.

O acordo de limite da dívida, que foi aprovado de forma esmagadora pela Câmara na noite de quarta-feira, suspenderia o teto da dívida de US$ 31,4 trilhões até janeiro de 2025, ao mesmo tempo em que cortaria os gastos com programas domésticos.

Isso aumentaria os gastos do Pentágono para US$ 886 bilhões no próximo ano, um aumento de 3%, mas o Partido Republicano, defensor de gastos maiores para os militares, observou que isso não acompanharia o ritmo da inflação e argumentou que o pacote ficou muito aquém do que era necessário.

O prazo, no entanto, limitou as opções. Após a demora nas negociações e aprovação na Câmara, onde o Partido Republicano, que parece mais insatisfeito com a folga dada ao Orçamento de Biden, tanto o líder da maioria democrata no Senado, Chuck Schumer, quanto o líder republicano Mitch McConnell, já haviam concordado que era necessário aprovar o plano antes do default.

— Os Estados Unidos podem dar um suspiro de alívio porque estamos evitando a inadimplência — disse o senador Chuck Schumer, democrata de Nova York e líder da maioria, antes do início da votação.

Aprovação comemorada

Embora o projeto final não tenha agradado a totalidade dos democratas e nem dos republicanos, autoridades dos dois partidos tentaram apontar pequenas conquistas dentro do projeto como vitórias particulares. Enquanto o líder republicano Kevin McCarthy foi elogiado por parte do establishment do partido por ter obrigado o governo a aceitar limitações de gasto nos próximos anos, democratas tentaram promover a solução para o teto de endividamento como uma vitória de Joe Biden, apontando-o como um negociador capaz de fazer os partidos em pé-de-guerra cooperarem.

De acordo com o professor de Relações Internacionais Vinicius Rodrigues Vieira, da Faap, a aprovação na Câmara mostrou que o caminho para uma relação entre o governo e o Congresso ainda está aberto, mas ponderou que a resistência na base do Partido Republicano pode ser um problema para políticos abertos a esse diálogo.

— A aprovação do projeto na Câmara mostrou que ainda é possível se fazer política bipartidária nos Estados Unidos, o que é fundamental. Porém, de certa maneira, a base do Partido Republicano parece não querer alguém com o perfil negociador de McCarthy, mas de confronto, o que cai como uma luva para Donald Trump e Ron DeSantis perto das eleições — disse Vieira.

Para o professor de Política Internacional Dawisson Belém Lopes, da Universidadee Federal de Minas Gerais (UFMG), embora o momento nos EUA é de posicionamento de atores políticos para 2024, um senso de pragmatismo se impôs diante de uma questão estrutural muito importante para o país.

— A questão era de tal emergência que impôs o consenso bipartidário que vimos. Era necessário para o país seguir, senão os prejuízos viriam em cascata e atingiriam a população, e qualquer movimento de um lado ou de outro poderia ser um tiro no pé, já que a população seria prejudicada — afirmou o professor.

Ainda de acordo com Lopes, a aprovação do projeto antes do default mostra que os atores políticos cujo cálculo político mantém a racionalidade, mesmo que após discordâncias e sob pressão, ainda são maioria se comparados ao bloco ideologicamente radical — ao menos dentro do Congresso.


Fonte: O GLOBO