Avanços ucranianos até agora ocorriam em ritmo mais lento que o esperado, despertando indagações internacionais

A Ucrânia deu início a uma etapa aguardada de sua contraofensiva, aumentando os ataques contra as linhas de frente da Rússia no sul. O presidente da Rússia, Vladimir Putin, disse nesta quinta-feira que os confrontos se "intensificaram significativamente" na região de Zaporíjia, no que analistas veem como uma possível tentativa de recuperar territórios e romper com a ligação terrestre entre Moscou e áreas-chave da já há nove anos ocupada Península da Crimeia.

À Bloomberg, uma autoridade dos Estados Unidos que pediu para não ser identificada afirmou que os ucranianos fazem avanços significativos em Zaporíjia, uma das quatro áreas unilateralmente anexadas há quase um ano, junto com a vizinha Kherson e Donetsk e Luhansk, no leste. Nesta quinta, Putin também chamou atenção para o cenário na região quase sete semanas após Kiev começar sua contraofensiva:

— As Forças Armadas da Ucrânia intensificaram significativamente suas operações militares, principalmente na região de Zaporíjia, mas não foram bem-sucedidas — disse o chefe do Kremlin à agência estatal RIA Novosti. — As perdas russas na ofensiva ucraniana são dez vezes menores que as das Forças Armadas da Ucrânia. O que aconteceu no último dia é um exemplo vívido do heroísmo maciço de nossos soldados.

As declarações do presidente russo, que não puderam ser imediatamente confirmada, coincidem com uma cúpula que realiza em São Petersburgo para reforçar laços com os países da região e projetar uma influência crescente no Sul Global. O comparecimento, contudo, ficou aquém do esperado: apenas 17 chefes de Estado haviam confirmado presença, menos da metade dos 43 que estiveram presentes em 2019.

O Comando-Maior da Ucrânia, por sua vez, disse que os russos concentram seus "principais esforços em prevenir mais avanços" de Kiev. Segundo os militares, as forças ucranianas "continuam a conduzir uma operação nas direções de Melitopol e Berdyansk" — ambas cidades estão no Mar de Azov, que o país invadido deseja alcançar para abrir uma brecha entre os territórios ocupados pela Rússia no leste e no sul e cortar a conexão terrestre com a Crimeia.

Cautela de Kiev

O Comando-Maior se recusou a confirmar se a contraofensiva entrou em uma nova etapa. Anonimamente, contudo, militares ucranianos disseram que unidades de reserva ainda não haviam sido deslocadas para a operação e que as tropas já engajadas buscavam criar brechas na defesa russa.

— Glória a todos os que defendem a Ucrânia! A propósito, nossos meninos na frente tiveram resultados muito bons hoje — disse Zelensky em seu discurso de quarta à noite, sem maiores informações. — Bom trabalho! Detalhes depois.

Analistas do Instituto para o Estudo da Guerra, um centro de pesquisa sediado em Washington, disseram que "uma significativa operação contraofensiva mecanizada" parece ter "avançando em certas posições de defesa russas previamente preparadas". Afirmam, entretanto, que um leque de declarações divergentes de blogueiros militares russos sobre a escala do ataque e o número de baixas fazem com que a situação seja pouco clara.

Autoridades ucranianas admitiram nas últimas semanas que a contraofensiva vem sendo mais difícil que o esperado, com avanços lentos entre os campos minados, barreiras de tanques e trincheiras russas. O controle e a superioridade militar do Kremlin também dificulta que seus avanços terrestres tenham apoio aéreo.

Paralelamente, Kiev e oficiais militares ocidentais apontavam para uma estratégia de desgastar unidades russas com poucos homens na frente de 1,5 mil km. A abordagem inclui conter a principal força de assalto ucranianas — elas têm o apoio de unidades equipadas e treinadas pela Organização para o Tratado do Atlântico Norte (Otan) —, para que possam explorar pontos fracos e romper as linhas russas.

Os ucranianos já recorreram a tais distrações, criando uma armadilha para em seguida dar seu golpe fatal. Um exemplo disso foi sua operação no ano passado no sul, que voltou a atenção de Moscou para a região, seguida da retomada de territórios no Norte do país há pouco menos de um ano.

— A questão agora é se os ucranianos estão mobilizando algumas das unidades que retiveram e pondo todas na contraofensiva — disse o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, a repórteres na Nova Zelândia.

Ao New York Times, dois funcionários não identificados do Pentágono afirmaram que a Ucrânia lançou a parte principal de sua contraofensiva. Também segundo fontes americanas ouvidas pelo jornal, o centro dos esforços ucranianos seria na direção de Robotyne, a cerca de 10 km da cidade de Orikhiv, controlada pelos ucranianos, e 80 km ao norte de Melitopol.

— Dizemos desde o início que esta seria uma dura luta, que seria uma guerra longa e com desafios, sucessos e contratempos — disse o secretário de Defesa dos EUA, Lloyd Austin, a repórteres na quinta-feira em uma coletiva de imprensa em Papua-Nova Guiné. — Eles estão trabalhando para passar pelos campos minados e outros obstáculos, mas ainda têm muito poder de combate — completou ele, sem comentar diretamente sobre a contraofensiva.

Novos ataques em Odessa

Um militar ucraniano, contudo, rechaçou o afirmado pelas autoridades americanas, alergando que as forças de Kiev estavam em posições defensivas ao redor de Robotyne. Um funcionário da Embaixada da Ucrânia em Washington também alertou ao NYT que seria contraproducente retratar qualquer parte da contraofensiva como uma batalha decisiva, descrevendo a guerra contra a Rússia como uma longa série de operações.

As Forças Especias ucranianas, por sua vez, divulgaram um vídeo que parece mostrar soldados ucranianos fazendo soldados russos de prisioneiros no vilarejo de Staromaiorske. O local, a aproximadamente 144 km ao norte de Berdyansk, fica perto de uma aglomeração de pequenas autoridades agrícolas ao longo de um rio sinuoso — área reivindicada por Kiev nos dias iniciais da contraofensiva.

Em paralelo, os russos intensificaram seus ataques contra Odessa, cidade no sul da Ucrânia cujo porto era fundamental para o acordo de grãos mediado há um ano pela ONU e pela Turquia e suspenso pelos russos na semana passada. Um homem morreu, segundo o governador local, Oleg Kiper, em decorrência dois mísseis tipo Kalibr disparados de um submarino no Mar Negro e que não puderam ser interceptados.

As instalações de um terminal para carga também ficaram danificadas, um pequeno edifício foi destruído, assim como dois veículos. Segundo a Força Aérea da Ucrânia, os russos também lançaram oito drones kamikazes contra as regiões de Khmelnitski, no oeste; Dnipropetrovsk, no centro-este, e Donetsk. Todos eles foram derrubados.


Fonte: O GLOBO