Jofre dos Santos, de 49 anos, tinha mandado de prisão em aberto por ter matado outro cigano, há cerca de 12 anos, após desentendimento por troca entre celular e bicicleta

Um ataque a tiros em plena luz do dia que deixou quatro mortos e dois feridos nesta segunda-feira (14), em Feira de Santana, na Bahia, teria sido motivado por uma vingança entre comunidades ciganas, por conta de um assassinato cometido há cerca de 12 anos. O autor do crime teria sido Jofre Souza dos Santos, de 49 anos, um dos mortos na emboscada.

Jofre já tinha um mandado de prisão em aberto pelo homicídio e estaria na cidade justamente para se apresentar à Justiça. Todas as vítimas eram da mesma família e almoçavam num bar e restaurante no momento em que foram surpreendidas por uma chuva de tiros – segundo a perícia, cerca de 30 disparos.

Além de Jofre, os outros ciganos assassinados são Amilton Valadares dos Santos, de 51 anos, Agnaldo de Oliveira Souza Júnior, de 35 e Altamir de Oliveira Souza, de 27. Uma outra parente foi baleada na perna, levada ao hospital, mas já recebeu alta. Uma sexta pessoa, cliente do bar, também foi atingida, no braço, e também passa bem.

Para a polícia, a principal hipótese é de vingança, arquitetada por um grupo de ciganos contra outro. No entanto, outras possibilidades ainda não são descartadas. Jofre respondia a um processo criminal de 2011, na cidade de Feira de Santana, por homicídio contra outro cigano. Segundo as investigações feitas à época, por motivo torpe.

– Segundo o inquérito que apurou a morte na época, a desavença que culminou na morte, foi por motivo fútil, em razão de uma discussão – revela Rodolfo Faro, delegado titular da Delegacia de Homicídios de Feira de Santana.

De acordo com o investigador, uma desavença por conta da troca de um celular por uma bicicleta teria motivado o crime praticado por Jofre. Apesar de o assassinato ter acontecido há mais de dez anos, o processo estava em fase inicial. 

Ele sequer havia sido ouvido. Com mandado de prisão em aberto, o cigano, que estava vivendo em outro município, teria resolvido ir a Feira de Santana com a família em busca de tentar reverter a situação junto à Justiça. A partir disso, os desafetos teriam tomado ciência e arquitetado o crime.

– O Jofre seria ouvido em audiência no dia 25 de setembro e tinha em seu desfavor um mandado de prisão preventiva, por se encontrar em local incerto desde então – conta o delegado. – Segundo informações, teria vindo para Feira de Santana para se apresentar a Justiça e tentar revogar sua prisão.

Cigano vinha sofrendo ameaças

A polícia agora trabalha para identificar suspeitos e confirmar a principal hipótese.

– Estamos fazendo diligências no sentido de localizar mais câmeras de segurança que possam ter flagrado a fuga do veículo utilizado no crime. Mas ainda sem informação sobre os executores. A policia trabalha agora para verificar se o crime ocorrido em 2011 tem de fato relação com a motivação desse quadruplo homicídio – conclui Faro.

O delegado Yves Silva Correia, coordenador da Polícia Civil em Feira de Santana, e que está à frente do caso, acrescentou ainda que o suposto alvo dos criminosos vinha sofrendo ameaças.

– Estamos trabalhando em várias linhas de investigação, mas a principal é essa, porque esse cigano, o Jofre, vinha sendo ameaçado, até por conta de ter se envolvido em um homicídio pretérito. A polícia está trabalhando para tentar identificar esses autores – acrescentou.

Violência, vinganças e sangue derramado

Há menos de um mês, um caso trágico envolvendo a morte da adolescente cigana Hyara Flor, de 14 anos, gerou grande repercussão, também na Bahia, no município de Guarantinga. Casada com outro jovem de 14 anos, ela morreu após ter sido atingida por um tiro no rosto. 

As investigações e as exposições feitas pelos parentes, de lado a lado, revelaram uma relação de violência, traição, desavenças e ameaças entre as duas famílias ciganas. Por fim, a polícia concluiu que a menina morreu após um disparo acidental feito pelo cunhado de 9 anos, criança que brincava com a pistola da sogra dela, que havia sido deixada em seu quarto. A mulher foi indiciada por porte ilegal de arma e homicídio culposo.

E os casos de violência envolvendo comunidades ciganas não são raros na Bahia, como confirma a polícia. Para além de desavenças que são resolvidas muitas das vezes "com as próprias mãos", há caso até de morte e perseguição pela polícia na Bahia.

– Creio que essas disputas e desavenças tenham um cunho cultural das próprias comunidades ciganas. Por via de regra não, elas não procuram a polícia ou a Justiça para dirimir os seus conflitos pessoais – comenta o delegado Rodolfo Faro.

Em 2020, um cigano teve a morte encomendada por membros da própria família, também por vingança. Isso porque três anos antes ele e o irmão teriam sequestrado o primo e exigido milhões pelo resgate. De acordo com o jornal local Correio 24 horas, como o pai da vítima pagou apenas R$500 mil, os irmãos mataram o sobrinho esquartejado e mandaram a cabeça para o pai dele.

Antes de ser morto em 2020, o cigano ainda assassinou o genro em Eunápolis. Ele foi morto em Goiânia, quando estava num carro com a família e foi surpreendido por um outro cigano em uma moto.

Em 2021, os assassinatos de dois policiais militares em Vitória da Conquista, supostamente cometidos por integrantes de uma comunidade cigana no interior baiano, também culminaram em derramamento de sangue: ao menos 8 irmãos da mesma família foram mortos em ações policiais, ainda segundo o jornal Correio 24 horas. Em todos os casos, de acordo com o portal, a Polícia Militar negou qualquer tipo de retaliação.


Fonte: O GLOBO