O futebol terá mudado profundamente, sobretudo enquanto mercado, também em sua cultura

Se alguém me dissesse anos atrás que o futebol brasileiro faria a sua própria versão do plano desenvolvimentista de Juscelino Kubitschek — 50 anos em cinco —, confesso que desconfiaria do interlocutor. Vender clube grande para empresário estrangeiro? Difícil. Constatar que fundos de investimento fazem fila para comprar uma liga que nem existe? Improvável. Não é que não tenhamos potencial. Achei que não conseguiríamos superar as forças contrárias na execução. Mas cá estamos.

A apropriação do lema kubitschekiano não é um exagero, e hoje podemos provar. Red Bull, Textor, Ronaldo, 777 Partners, City Football Group, Menin. Todos esses nomes entraram para o vocabulário do torcedor brasileiro numa posição que parecia inaceitável no passado — a de dono. Mubadala, General Atlantic e CVC já aparecem no noticiário, mas falta o desfecho da história da liga para que assumam seus papéis. Neste novo ano, o futebol decidirá o que pretende ser.

Minha descrença de anos atrás não era infundada. Aquilo que muita gente tentou fazer por décadas, sem sucesso, começou a acontecer por volta de 2020. E começou de um jeito peculiar: desordenado, mal compreendido, resultado do esforço de poucos e de conjunturas favoráveis além do nosso alcance. Talvez seja isto o que define o progresso brasileiro. O fato é que de lá até 2024 o futebol terá mudado profundamente, sobretudo enquanto mercado, também em sua cultura.

Não tenho talento para Robério de Ogum, nem Mãe Dináh, mas escrever coluna em 1º de janeiro e não registrar qualquer previsão pegaria até mal. Posso começar pelo assunto em que já estamos, os clubes-empresas. Pois dois ou três times de relevância nacional encaminharão as vendas de suas SAFs. E neste caso me arrisco a dar os nomes: Athletico-PR, Fluminense e Santos.

O Athletico-PR está em busca de investidores com o auxílio de EY e Bank of America, e seu principal dirigente, Mario Celso Petraglia, já falou publicamente sobre o plano. No Fluminense, Mário Bittencourt avança na estruturação da empresa com o BTG. E o Santos, que está na segunda divisão, tem gente grande atrás de dinheiro para prosseguir no convencimento do novo-velho presidente, Marcelo Teixeira.

A liga vai sair. Os itens que separam os clubes em blocos, da Libra e do Forte Futebol, em sua maioria relacionados ao dinheiro dos direitos de transmissão, são poucos e estão em fase adiantada de negociação entre seus representantes. A composição entre investidores e intermediários de ambos os lados está próxima. Diálogos entre eles são constantes. Basta que os presidentes queiram resolver.

Antecederá o desfecho da liga a eleição para presidente da CBF. O vidente se abstém de nomear o vencedor da disputa, Flavio Zveiter ou Reinaldo Carneiro Bastos, pois pareceria torcida por um ou outro. Seja lá quem vença, deverá vir dele a chancela da confederação para que os clubes organizem o Campeonato Brasileiro.

Se as previsões parecerem otimistas, é porque aprendi a minha lição. Hoje não duvido que o futebol brasileiro está progredindo 50 anos em cinco. E se faltaram previsões futebolísticas, não seja por isto: o Flamengo voltará a ganhar um título, Abel Ferreira fará seu último ano no Palmeiras, e o campeão da Libertadores será argentino. Guarde este bilhete e me cobre ao fim de 2024.


Fonte: O GLOBO