O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, participou de forma virtual da reunião do conselho de administração que decidiu não distribuir os dividendos extraordinários da companhia, nesta quinta-feira (7). Mas ele não estava fora do Rio de Janeiro, onde fica a sede da petroleira, e nem sequer longa dali. Prates estava em seu próprio escritório, a poucos metros da sala de reuniões.

Segundo a explicação recebida por integrantes do conselho que estranharam a situação, Prates se fechou com integrantes da diretoria em sua sala e acompanhou a reunião pelo aplicativo de reuniões virtuais da companhia com a câmera fechada.

O motivo, de acordo com esses conselheiros, foi a insatisfação de Prates com o fato de já saber que seria derrotado na votação sobre os dividendos, e justamente pelos indicados do governo. Isso porque os cinco integrantes do conselho seguiram a decisão do presidente Lula de reter o dividendo extraordinário para reserva de capital.

Segundo a decisão tomada na noite de quinta-feira (7), a Petrobras vai distribuir R$ 14 bilhões em dividendos aos acionistas em abril, totalizando R$ 72,4 bilhões anuais, mas reter no caixa outros R$ 43,9 bi em reservas que poderiam ter sido destinadas aos acionistas.

A reação do mercado financeiro foi sair vendendo ações e derrubar o valor de mercado da companhia em mais de 10% nesta sexta-feira (8). Num único dia, a Petrobras se desvalorizou em R$ 55 bilhões.

A expectativa nos mercados era de que os dividendos fossem distribuídos, e nos dias que antecederam a reunião Prates tentou convencer o presidente Lula a liberar pelo menos parte do recurso. Até a manhã da quinta-feira, pouco antes da reunião do conselho, ele ainda chamou para uma conversa o conselheiro Bruno Moretti, em tese seu aliado no comando da companhia.

Mas, ao perceber que sua proposta seria derrotada, desistiu de participar da reunião na sala ao lado e ligou o computador.

Enquanto o CEO defendia a proposta da diretoria de distribuir metade dos destinados aos dividendos, os conselheiros de Lula preferiram enviar todo o dinheiro para a reserva.

O argumento do grupo é que a falta dos recursos no caixa poderia afetar a capacidade da companhia de obter financiamento para bancar o plano de investimentos, de fazer falta na execução do plano estratégico da companhia, que prevê investimentos de US$ 102 bilhões entre 2024 e 2028.

Ao final, a proposta de reter o dividendo extra foi aprovada por 6 votos – os do governo mais o da representante dos funcionários. Os quatro minoritários votaram pela distribuição de todo o valor e Prates, que defendia distribuir metade, se absteve.

A votação reflete o isolamento de Prates dentro do próprio núcleo governista da Petrobras e exemplifica um comportamento que tem se repetido quando ele é contrariado.

A última vez em que isso ocorreu foi em fevereiro, em uma reunião em que se discutiu o contrato da Petrobras com a produtora de fertilizantes Unigel.

A área técnica do Tribunal de Contas da União concluiu que o contrato de prestação de serviços firmado no final de 2023 deve dar um prejuízo de R$ 500 milhões à Petrobras, mas a diretoria, incluindo Prates, o defende.

Por causa disso, os conselheiros bombardearam os técnicos e diretores com perguntas e pedidos de explicação sobre a lógica do negócio. Irritado com a situação, o CEO abandonou a sala no meio da discussão, reclamando que não estavam deixando a sua equipe falar.

Desta vez, Prates se manteve em silêncio durante todo o encontro e só se manifestou ao final, protagonizando um bate boca com o presidente do conselho, Pietro Mendes, que é secretário do Ministério das Minas e Energia e homem de confiança do ministro Alexandre Silveira.

O ministro e o CEO disputam espaço e o poder de definir o rumo da Petrobras desde o início do governo. No conselho, a turma de Silveira votou contra os dividendos extraordinários. Prates ainda tentou argumentar que a decisão teria impacto muito forte sobre as ações – o que de fato ocorreu –, mas o placar já estava dado.

Isso não o impediu de acusar os conselheiros do governo de prejudicarem a companhia, no que foi apoiado por um dos representantes dos minoritários Marcelo Gasparino. O clima só não esquentou mais por que os três conselheiros não ocupavam o mesmo espaço físico. Deles, só Mendes estava na sala. Os outros estavam online.


Fonte: O GLOBO