Fundo americano vira cocontrolador do grupo carioca de ensino básico junto com BTG
O aporte deve ser o último relevante na companhia carioca antes de um IPO (oferta inicial de ações na Bolsa) e atesta o apetite de investidores internacionais por um segmento que movimenta R$ 80 bilhões ao ano no Brasil e cuja elevada fragmentação tem atraído grupos capitalizados com estratégia de consolidação.
— Diferentemente do ensino universitário, os principais players da educação básica não chegam a ter 3% do mercado. O processo de consolidação está apenas começando — justificou Brenno Raiko, sócio da Advent para investimentos em educação na América Latina. — Um dos pontos fortes da Inspira é colocar a escola no centro: ela não muda a essência pedagógica de cada escola, não entra na sala de aula. Sua execução tem a ver com o aprimoramento da gestão.
Em educação, a Advent só havia feito aportes no segmento de universidades no Brasil. O fundo é o maior acionista da Yduqs (dona de Estácio e Ibmec), com 14% das ações; antes, foi um dos maiores investidores da Kroton (hoje Cogna) e da Faculdade da Serra Gaúcha.
O aporte na Inspira foi 100% primário — ou seja, todo o dinheiro entrará no caixa da companhia e nenhum dos sócios anteriores vendeu qualquer ação. A companhia não informou em quanto foi avaliada com a transação, que transformará a Advent em cocontroladora da Inspira Rede de Educadores juntamente com fundos geridos pelo BTG Pactual, que compraram o controle do negócio em 2020 com um aporte de R$ 350 milhões. (Antes de a Advent chegar, os veículos do BTG tinham 83,2% da rede).
‘Gasolina para o foguete’
O negócio continuará sendo liderado pelo fundador André Aguiar, empreendedor criado no Jardim Catarina — um dos bairros mais pobres de São Gonçalo — que ascendeu com um diploma do Instituto Militar de Engenharia (IME) e chegou à diretoria de operações da Eleva Educação (hoje Salta).
Aguiar fundou a Inspira no Rio, em 2018, ao lado do advogado Luciano Fialho, sócio do escritório Fialho Salles e especializado em fusões e aquisições. Além daquele cheque do BTG, a companhia disse ter feito uma captação de R$ 500 milhões há dois anos.
— Com a Advent, a gente trouxe gasolina para o foguete. É uma verdadeira “refundação” da companhia, que inicia uma nova temporada, mas não muda em nada a estratégia. Nossa tese é comprar escolas de qualidade, independentemente do posicionamento — contou o fundador. — Sempre defendi que o valor está na escola, não nos sistemas de ensino. E a gente não coloca um cara da Faria Lima dentro da escola, mas alguém que tem a ver com a instituição.
(Antes de o investimento ser anunciado, circulou no mercado o rumor de que a Advent teria o plano de unir Inspira e Yduqs em um mesmo negócio. Mas tanto o fundo como a empresa negam essa intenção.)
A tese de que fala Aguiar se divide em quatro categorias-alvo, todas voltadas para alunos das classes A e B: performance, de instituições como o PB e voltadas para aprovação em vestibulares disputados, entre eles medicina, IME e Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA); escolas tradicionais de excelência, como o Colégio Magnum, de Belo Horizonte; escolas de vanguarda, como o Cândido Portinari, de Salvador; e escolas internacionais, como a Canadense de Niterói.
‘Não vamos fazer loucuras’
A Inspira diz ter crescido 93% ao ano desde o primeiro investimento do BTG, registrando R$ 1,1 bilhão em receitas líquidas no ano passado e 57 mil alunos matriculados. Mas o cheque da Advent chegou em momento de desaceleração das aquisições — no ano passado, a Inspira só comprou o Crescimento (MA) —, em que a companhia se concentrou em reduzir sua alavancagem. A dívida foi reduzida para menos de R$ 800 milhões, recuando de três vezes para pouco mais de duas vezes seu Ebitda (lucro antes de impostos e depreciação, uma métrica de geração de caixa operacional).
— A gente não tem pressa para gastar esse R$ 1 bilhão, não vamos sair fazendo loucuras — ponderou Aguiar, acrescentando que não haverá distribuição de dividendos aos acionistas até o IPO, previsto para o “médio prazo”. — Tem muita oportunidade de crescimento orgânico (expansão das marcas que a Inspira já tem), mas a gente quer crescer de maneira inorgânica (aquisições) sobretudo nas tradicionais e na internacional.
Crescimento (MA), única escola comprada pela Inspira em 2023, quando grupo focou em desalavancar balanço — Foto: Divulgação
Parte da estratégia está na “internacionalização” de escolas tradicionais, por meio da certificação International Baccalaureate (IB). O plano é terminar o ano com oito escolas certificadas.
Lemann vende
O aporte da Advent ocorre poucas semanas depois de o principal “rival” da Inspira na consolidação da educação básica, o grupo Salta (pH, Pensi e Elite) passar por mudança societária importante. Três gestoras (Atmos; Mission Co., de ex-sócios da Gávea Investimentos; e Warburg Pincus) compraram quase um terço do negócio. Quem vendeu foi a Gera Capital, que tem entre seus investidores Jorge Paulo Lemann e o Opportunity — ou seja, o capital aportado foi para o bolso dos acionistas vendedores, não para o caixa do Salta.
O investimento na Inspira se deu por meio do sétimo fundo da Advent dedicado à América Latina, o LAPEF VII, que tem US$ 2 bilhões em capital. O processo durou cerca de oito meses, foi conduzido pelo banco de investimento UBS BB e envolveu mais de uma dezena de propostas de fundos internacionais.
Por meio da Advent, também participou do aporte o Canada Pension Plan Investments (CPPI), que investe o patrimônio para a aposentadoria de 22 milhões de canadenses e já é acionista de brasileiras como a Smartfit.
Entre os investimentos recentes da Advent no Brasil está a compra de 25% da Tigre, de tubos e conexões, por R$ 1,35 bilhão; e a aquisição de fatia majoritária na Skala Cosméticos, de cremes para cabelo. O veículo também é acionista de Nubank e Ebanx, startup curitibana que processa pagamentos online para firmas como Spotify e Amazon. Nos desinvestimentos, a Advent acaba de vender a Kopenhagen para a Nestlé e, em 2021, passou para o Carrefour a operação do Walmart no Brasil.
(Atualização: o texto foi atualizado para corrigir informação sobre captação de R$ 500 milhões feita pela Inspira há dois anos. Diferentemente do que o texto informava, a transação não envolveu emissão de debêntures.)
Fonte: O GLOBO
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