Impasses se concentram em São Paulo, onde Bolsonaro acena a outras siglas e não alinhados à cúpula da sigla
Porto Velho, Rondônia - Uma disputa entre o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, e Jair Bolsonaro provocou a decretação de uma espécie de “lei do silêncio” para bolsonaristas e qualquer filiado sobre candidaturas de outros partidos. O conflito ocorre sobretudo em São Paulo, onde o ex-presidente acena com o apoio a nomes de outras siglas e não alinhados à cúpula do PL. Em meio a esse racha interno, aumentou a pressão para que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), se filie à legenda, mas aliados do ex-ministro de Bolsonaro afirmam que isso não deve se concretizar antes das eleições municipais.
Os casos mais evidentes de racha entre Valdemar e Bolsonaro estão em municípios paulistas. Resolução publicada pelo presidente do PL proíbe correligionários de prestar apoio a nomes de fora do partido onde a sigla tiver candidato nas eleições municipais. O documento ressalta a possibilidade de abertura de processo ético-disciplinar contra aqueles que desrespeitarem a regra.
Guarulhos, por exemplo, é uma cidade considerada fundamental por ser o segundo maior colégio eleitoral do estado. Lá, Valdemar quer o vereador Lucas Sanches (PL) como candidato à prefeitura. Bolsonaro, porém, gravou um vídeo com o líder do governo Tarcísio na Assembleia Legislativa, o deputado Jorge Xerife do Consumidor (Republicanos).
Divergências
Em Ilhabela, Valdemar defende apoio à reeleição do prefeito Toninho Colucci (PL), enquanto Bolsonaro apoia a vereadora Diana Matarazzo (Podemos). Já em São Sebastião, no litoral norte do estado, não há consenso em relação ao nome de Reinaldinho Moreira, atual vice-prefeito e defendido por Valdemar a pedido de Tarcísio. Bolsonaro segue defendendo a candidatura de Wagner Teixeira (União).
— A sensação que tenho é que o bolsonarismo está impedido de ter representante legítimo em São Sebastião. Estou sendo traído. Eu contava com um vídeo feito pelos membros da família Bolsonaro, mas agora eles ficarão sujeitos a punições — diz Teixeira.
Ex-ministro do Meio Ambiente, o deputado Ricardo Salles (PL-SP) respondeu de forma indireta à resolução de Valdemar. “Faço campanha para quem eu quiser”, postou ele em uma rede social.
A diretriz baixada por Bolsonaro já teve consequências no PL do Rio. Como mostrou a colunista Malu Gaspar, o presidente do partido em Angra dos Reis, Valmir Servolo, pediu na sexta-feira ao conselho de ética do partido a expulsão da deputada federal Soraya Santos e da estadual Célia Jordão.
Na noite anterior, as duas estiveram no lançamento da pré-candidatura de Claudio Ferretti (MDB), escolhido pelo prefeito Fernando Jordão (PL) para disputar sua sucessão. Jordão é marido de Célia. Já Soraya tem em Angra sua base eleitoral.
O pré-candidato do PL na cidade é o empresário Renato Araújo, que é amigo de Bolsonaro e atuou na reforma de sua casa de praia na Vila Histórica de Mambucaba, em Angra.
Procurada, Célia disse que desconhecia o pedido de expulsão e que tanto ela quanto o marido vão continuar trabalhando pelo fortalecimento do PL e pelo apoio a Ferretti, já que as convenções partidárias ainda não ocorreram. Procurada, Soraya não respondeu.
Em outra frente, aliados de Tarcísio dizem não esperar uma migração de partido do governador antes das eleições municipais. Eles atribuem a recente declaração de Valdemar sobre o assunto a uma “estratégia política”. Valdemar disse no domingo ao jornal “O Estado de S. Paulo” que Tarcísio lhe comunicou sua decisão de deixar o Republicanos e se filiar ao PL até julho. O sinal verde de Tarcísio foi confirmado ao GLOBO por Valdemar. O entorno do governador, no entanto, diz que a conversa é antiga.
Sabesp no cálculo
Três secretários do governo de São Paulo, consultados sob reserva, negam movimentações recentes. Um deles acredita que o cacique quer tornar o PL mais atrativo, enquanto negocia alianças com outros partidos, que veriam na filiação do governador uma demonstração de força.
Outro membro do primeiro escalão do governo paulista diz não ver motivos para Tarcísio deixar o Republicanos agora, uma vez que isso criaria turbulências “desnecessárias” ao longo do processo eleitoral. Uma movimentação dessa dimensão poderia atrapalhar negociações e o arco de alianças do principal aliado de Tarcísio no pleito, o prefeito da capital, Ricardo Nunes (MDB).
Para um deputado federal aliado, Tarcísio deve evitar uma movimentação partidária tão cedo para não atrapalhar a privatização da companhia estatal de água e saneamento, a Sabesp, uma de suas principais bandeiras.
O assédio do PL, somado à relação fria de Tarcísio com o Republicanos, alimenta a avaliação de que ele poderá deixar o partido em um futuro próximo. À CNN Brasil, no domingo, o governador descartou migrar agora:
— Não teremos esse movimento no momento.
Presidente do Republicanos, o deputado Marcos Pereira (SP) disse não ter sido procurado para tratar do assunto:
— Não falei com Valdemar, não falei com Tarcísio, não falei com ninguém. Tudo o que sei foi lendo na imprensa.
Dirigentes do Republicanos se mostraram irritados com Valdemar e Bolsonaro pela insistência no assunto. A cúpula avalia que o assédio é uma forma de pressionar o governador.
Outro ponto de atrito é com correligionários que hoje esperam o governador como cabo eleitoral para as eleições de outubro. O Republicanos, que elegeu 21 prefeitos em 2020, calcula ter triplicado esse número — entre 60 e 70, na estimativa de um dirigente nacional — ao longo dos últimos quatro anos, principalmente após a chegada da sigla ao poder do estado. O partido administra cidades importantes como Sorocaba e Campinas.
O governador é apontado como o principal herdeiro político do ex-presidente, que está inelegível, e principal aposta dos bolsonaristas para disputar a Presidência em 2026.
Fonte: O GLOBO
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