Ação abrange toda a cúpula do Rio, podendo levar à perda de mandato também o vice Thiago Pampolha e o presidente da Assembleia Legislativa, Rodrigo Bacellar

Porto Velho, Rondônia - O Tribunal Regional Eleitoral do Rio (TRE-RJ) inicia hoje ao julgamento que pode culminar na cassação do governador Cláudio Castro (PL), do vice Thiago Pampolha (MDB) e do presidente da Assembleia Legislativa, Rodrigo Bacellar (União). A acusação do Ministério Público Eleitoral (MPE) envolve o suposto uso de cargos “secretos” do governo para fins eleitorais em 2022, e a avaliação de pessoas envolvidas no processo é que o cenário é imprevisível na Corte, com um possível placar apertado.

Por afetar toda a cúpula política do estado, a eventual condenação dos três — que ainda precisaria ser avalizada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) — faria o Rio ser governado de forma interina pelo presidente do Tribunal de Justiça até a convocação de novas eleições. Outros seis políticos com cargos eletivos são alvos de pedidos de perda dos direitos políticos e inelegibilidade.

Um caso à parte é o de Pampolha. Apesar de também ter sua cassação pedida pelo MPE, a acusação afirma que, como ele entrou em cima da hora no posto de vice da coligação, “todos os fatos abusivos desvendados nesta demanda já estavam em curso (...), não sendo razoável presumir a sua participação, contribuição e/ou anuência com as condutas ilícitas que alicercem a sua condenação à grave e personalíssima sanção de inelegibilidade”. Na prática, portanto, o órgão demanda a perda do cargo do emedebista, mas não dos direitos políticos.

Com base nisso, e em meio a um contexto de ruptura política com Castro, a defesa de Pampolha defendeu dois cenários nas alegações finais ao TRE. O primeiro pede a absolvição total da chapa. Mas, no caso de cassação, que o vice não seja atingido.

O centro da acusação

No centro da acusação está a “folha de pagamento secreta” com 27 mil cargos na Fundação Ceperj e 18 mil na Uerj, revela pelo portal Uol. O verdadeiro objetivo das nomeações seria usar a máquina do estado para benefícios eleitorais. No total, segundo o MPE, os saques de dinheiro em espécie desses funcionários passaram de R$ 220 milhões, e testemunhas corroboram a versão de que atuaram em prol de candidaturas.

Além dos três da cúpula do Rio, há outros políticos com cargos eletivos abarcados pelos pedidos de perda de direitos políticos. Todos eles, segundo o MPE, praticaram “ilícitos” de abuso de poder político e econômico, “a fim de utilizar a máquina pública, à exclusiva disposição dos investigados, para obter vantagens financeiras ilícitas com recursos públicos e lograrem êxito na reeleição ao Governo do Estado, nas Eleições Gerais de 2022.”

Especificamente contra Castro, a acusação imputa uma “decisiva atuação” no âmbito das irregularidades.

“Era ele o agente público detentor do poder político que se irradiou em todos os atos, inclusive os subsequentes praticados pelos demais investigados, seja em virtude da prática pessoal; seja por ordem direta sua ou de seu alto escalão; seja, ainda, por sua franca conivência e proveito eleitoreiro com situações escandalosas suportadas pela sociedade fluminense”, escrevem nas alegações finais os procuradores eleitorais Neide Cardoso de Oliveira e Flávio Paixão.

Castro escalou uma banca de advogados de perfis distintos. O principal é Eduardo Damian Duarte, experiente defensor de causas eleitorais no Rio. Outra é Luciana Pires, que ganhou notoriedade no caso das “rachadinhas” do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Ela tem boa relação com ministros de tribunais superiores indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. A partir do próximo mês, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça assume uma cadeira na Corte eleitoral, onde já está o outro indicado no governo Bolsonaro, Kassio Nunes Marques.

“Presunções”

Nas alegações finais junto ao TRE, a defesa do governador afirma que “restou demonstrada a absoluta falta de conexão eleitoral em relação aos fatos ventilados, inexistindo qualquer ato praticado pelo Chefe do Executivo eivado de desvio de finalidade, muito menos pode se falar em benefício eleitoral com base em presunções.” Para justificar o aumento abrupto de gastos no Ceperj, cita uma demanda represada da pandemia. Também destaca a diferença superlativa de votos de Castro para Marcelo Freixo (PT, ex-PSB) na eleição: mais de 2,6 milhões de vantagem.

O TRE é considerado por advogados um colegiado de difícil leitura. Estão ali sete julgadores de origens distintas e que permanecem por apenas dois anos no tribunal eleitoral. São três desembargadores, dois juízes e dois advogados.

No caso da folha secreta do governo, o relator é o desembargador Peterson Barroso Simão. O voto dele será dado após as sustentações orais da acusação e da defesa. Pela acusação, falam dois representantes: o do MP Eleitoral e o da candidatura de Freixo.

A expectativa é que o julgamento não termine neste primeiro dia. Depois do relator, os outros seis magistrados precisam dar seus votos. Existe também nos bastidores a percepção de que um deles tende a pedir vista — o que significa mais tempo para analisar o processo.

O caso que pode cassar a cúpula da política do Rio

O que está em julgamento?

O Ministério Público Eleitoral pede a cassação da cúpula da política do Rio por abuso de poder político e econômico. Os órgãos usados para suposto uso eleitoreiro foram a Fundação Ceperj e a Uerj. No centro da acusação, está a “folha de pagamento secreto” com 27 mil cargos no Ceperj e 18 mil na Uerj. O verdadeiro objetivo das nomeações seria usar a máquina do estado com fins eleitorais.

Os principais alvos:

Cláudio Castro - governador

Segundo o MP, o político com cargo mais alto entre os investigados “teve decisiva atuação nos âmbitos da CEPERJ e da UERJ (...) para a consecução do objetivo ilícito. Era ele o agente público detentor do poder político que se irradiou em todos os atos (...)”

Thiago Pampolha - vice-governador

Como Pampolha só virou vice de Castro em cima da hora, o MP entende que ele não participou ativamente do esquema. Por isso, não pede sua inelegibilidade. No entanto, já que integrou a chapa e acabou beneficiado, a acusação entende que também precisa ser cassado.

Rodrigo Bacellar - presidente da Alerj

O aliado do governador é peça central na acusação. “O escárnio foi tamanho que os saques realizados em Campo dos Goytacazes-RJ, reduto eleitoral do investigado, foram estratosféricos”, cita o MP.

Outros julgados com cargos eletivos
  • Aureo Ribeiro - deputado federal pelo Solidariedade
  • Max Lemos - deputado federal pelo PDT
  • Léo Vieira - deputado estadual pelo Republicanos
  • Bernardo Rossi - secretário estadual de Ambiente
  • Gutemberg de Paula Fonseca - suplente de deputado federal pelo PL
  • Marcos Venissius da Silva Barbosa - suplente de deputado federal pelo Podemos
Acusações e provas
  • Saques - A investigação mapeou a concentração de saques de dinheiro em espécie em locais identificados como redutos eleitorais dos investigados. No total, foram mais de R$ 220 milhões movimentados.
  • Testemunhas - Relatos de nomeados para os cargos confirmaram aos investigadores que atuavam com objetivos eleitorais.
  • TCE - Auditores do Tribunal de Contas também prestaram depoimento, corroboraram que as contratações não passaram por lá e reconheceram que o volume desembolsado com os programas causou surpresa.
  • Aumento de gastos - Um dos pontos centrais é a falta de transparência do método de contratação adotado, aponta o MP. Houve um gasto superlativo com pessoal, “sem qualquer necessidade e/ou situação emergencial que justificasse”.
  • Nomeados com atuação partidária - Entre os nomeados no esquema de “folha secreta”, foram identificadas mais de mil pessoas vinculadas a diretórios de partidos.confirmação do presidente da República)
Cenários

>>> O MP Eleitoral pede a condenação dos nove políticos citados. O cenário de maior impacto político para o estado ocorre se o governador, o vice e o presidente da Alerj perderem os cargos — o que levaria o presidente do Tribunal de Justiça a assumir o governo de forma provisória e convocar novas eleições.

>>> Uma leitura heterodoxa que pode acontecer é a separação entre Castro e Pampolha na condenação. Ou seja, entenderem que o governador precisa ser cassado, mas o vice, não. O próprio MP, apesar de manter o pedido de cassação de Pampolha, pediu para não deixá-lo inelegível caso condenado. A defesa dele argumenta que, caso haja a cassação de Castro, o vice deveria ser preservado.

>>> Também há a hipótese de o colegiado entender que as acusações não justificam a cassação dos investigados.

Se o TRE cassar, eles saem imediatamente?

Não. O imbróglio jurídico é complexo. Mesmo se o TRE tiver maioria pelas cassações e tomar a decisão, há um efeito suspensivo que permite os acusados se manterem nos cargos até que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) se debruce sobre a decisão.

Como será o julgamento?

Início - A sessão está marcada para começar às 14h.
  • Sustentações - Haverá sustentações orais dos autores das ações que pedem a cassação: o MP e Marcelo Freixo, que perdeu para Castro em 2022. Os advogados também têm 15 minutos para fazer a defesa dos acusados.
  • Voto do relator - O primeiro voto é o do relator, Peterson Barroso Simão. A partir do entendimento dele, os demais julgadores vão avaliar se concordam ou discordam da tese apresentada.
  • Ordem dos votos - Depois do relator, a ordem segue o critério de antiguidade invertida: começa pelos que entraram há menos tempo na Corte e vai até o mais antigo.

Fonte: O GLOBO