Oposição articulou união das bancadas da bala, do boi e da Bíblia para tentar impor novas derrotas ao governo em pautas de costume
A estratégia foi costurada após uma reaproximação entre Bolsonaro e as três frentes parlamentares, na articulação para manter o veto que ele mesmo fez quando era presidente a trechos da lei de segurança nacional que criminalizavam a disseminação de notícias falsas. Na mesma sessão, o Congresso ainda derrubou as saidinhas dos presos.
A prioridade do grupo será tentar aprovar ainda nesta semana o projeto do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) que equipara o aborto ao homicídio, se realizado após a 22a semana de gestação e quando o feto for "viável". Outro foco do grupo é fazer avançar a proposta de emenda à Constituição (PEC) que criminaliza o porte de drogas.
A PEC já foi aprovada pelo Senado e será analisada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara na próxima terça-feira. A constitucionalidade de aborto e drogas é tema de julgamentos ainda não concluídos no Supremo Tribunal Federal (STF).
Os dois projetos vão testar a ideia de unir as bancadas para votar em conjunto contra pautas do governo tidas como ideológicas e que afrontem os interesses de qualquer uma das frentes. O plano foi confirmado à equipe do blog por dois líderes das bancadas e pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que é líder da minoria no Congresso.
“Ficou combinado que no caso de pautas de costumes, mesmo que o assunto afete apenas uma frente, todas as outras serão solidárias”.
Como exemplo dessa solidariedade, o líder da frente da segurança pública, deputado Alberto Fraga (PL-DF), cita o apoio expressivo da bancada evangélica a um projeto que enxugou um decreto de Lula que restringia o acesso a armas e vetava, por exemplo, a presença de estandes de tiro nas proximidades de escolas – outra votação da última terça-feira em que o governo foi derrotado.
“Evidente que tem parlamentares da minha frente ou das outras que infelizmente seguem a orientação do governo. Mas quando a pauta é de costumes, ideológica, não perdemos uma”, afirmou Fraga à equipe do blog.
Se a promessa for cumprida, a aliança entre os blocos promete causar estragos para o Palácio do Planalto. Só a frente parlamentar do agro é composta oficialmente por 295 deputados e 50 senadores. A evangélica soma 205 deputados e 26 senadores, enquanto a da segurança pública tem 256 deputados (não há frente formal sobre o tema no Senado).
Desarticulação
Conhecidas como bancadas “BBB”, sigla para “da bala, do boi e da Bíblia”, os blocos estavam desarticulados desde o 8 de janeiro.
"Muita gente ficou assustada com aquilo, mexeu com a harmonia das bancadas. Mas a articulação das últimas semanas para derrotar os vetos de Lula ajudou a consolidar a união das frentes", conta Sóstenes Cavalcante, um dos líderes da bancada evangélica.
Os ataques às sedes dos Três Poderes colocaram Bolsonaro na mira de novas investigações do Supremo Tribunal Federal (STF) e, no ano passado, o Planalto conseguiu estancar os efeitos de duas comissões parlamentares de inquérito (CPI) originalmente protocoladas por bolsonaristas: a do 8 de janeiro e a do MST.
Já na semana passada, com o bolsonarismo reagrupado, o governo Lula perdeu todos os embates ligados às pautas de costumes – e por placares acachapantes. Os conservadores também contaram com traições de deputados filiados a partidos do Centrão com assento na Esplanada dos Ministérios.
Além da flexibilização do decreto de armas, também foram derrubados vetos às saídas temporárias de presos e à restrição do empenho de recursos do orçamento em temas que contrariem a pauta conservadora, como o financiamento do MST e cirurgias de mudança de sexo em crianças – a chamada “emenda patriota”.
Como publicamos na última sexta-feira, as derrotas provocaram uma mudança de rota na articulação política de Lula. A partir desta segunda-feira, o presidente da República se reunirá semanalmente com líderes do governo no Congresso e com parlamentares das bancadas aliadas na intenção de reajustar os ponteiros e prevenir o Planalto de novos reveses.
Para os bolsonaristas, porém, nem mesmo o empenho pessoal de Lula nas negociações com o Legislativo será capaz de mudar o cenário.
“No caso das pautas de costumes está mais do que provado que não existe articulação que resolva. Esse Congresso estava pronto para o presidente Bolsonaro”, dispara Flávio Bolsonaro, em referência ao viés ultraconservador da legislatura atual e à fracassada candidatura do pai a um segundo mandato em 2022.
Fonte: O GLOBO
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