Conhecido pelos programas policiais, apresentador de TV deve disputar a prefeitura de SP por partido do decano Aloysio Nunes, que optou por desfiliação no mesmo dia

Porto Velho, Rondônia - Em uma sala no Novotel Jaraguá, no Centro de São Paulo, o PSDB lançou a pré-candidatura de José Luiz Datena, que está em seu 11º partido sem jamais se candidatar. Na mesa principal, o deputado federal Aécio Neves, o ex-senador José Aníbal e o ex-governador Marconi Perillo, alguns dos nomes mais relevantes que restaram no partido, se referiram ao episódio como um “renascimento” do PSDB, apesar de tentarem convencer aos presentes de que o partido não está morto.

Na plateia, dezenas de pré-candidatos a prefeitos e vereadores sem muita projeção se acumulavam para ouvir o jornalista que ganhou fama apresentando programas policiais e que nunca teve cargo público.

A aposta do partido em Datena é grande: primeiro, que ele de fato será candidato, após anos anunciando que disputaria eleições por quatro vezes e ao fim desistir de todas elas. O segundo desafio é que a eleição, se concretizada, será calcada basicamente na popularidade do apresentador, já que o tempo de televisão, os recursos do fundo eleitoral e a base aliada são escassos.

Sem ele, as chances de retomar uma aliança com Ricardo Nunes (MDB) são ínfimas. O partido queimou as pontes com o prefeito — que chegou ao poder por causa da legenda, ao ser vice de Bruno Covas em 2020 — ao fazer duras críticas a sua gestão e até uma insinuação, por parte de Datena, de que o prefeito foi conivente com o crime organizado no transporte público da capital.

Se outrora o partido – que já elegeu um presidente por duas vezes, governou o estado mais populoso do país por 30 anos e foi um dos partidos mais relevantes do país — tinha nomes vindos da academia e de famílias tradicionais da política brasileira, como os Covas e os Neves, hoje aposta em um completo outsider para recuperar o prestígio da legenda.

— A grande vantagem do Datena é que, enquanto alguns estão fazendo um esforço enorme, até o próprio prefeito, para se tornar conhecido do conjunto da população, o Datena já é conhecido. então ele terá uma campanha mais leve, poderá circular por todas as regiões de São Paulo de forma destemida, de peito aberto, as pessoas vão querer abraçá-lo, vão querer conversar com ele, e ele será tomado por essa chama dos bons políticos — disse Aécio Neves, uma das pessoas que trabalhou ativamente para convencer o apresentador de assumir a empreitada.

Solução para uns, escolha errada para outros, como é o caso do ex-chanceler e ex-ministro Aloysio Nunes, tucano histórico que, horas antes do evento, anunciou que deixaria a sigla, engrossando o coro de outros políticos que abandonaram o barco tucano após a decisão de lançar candidatura própria em vez de apoiar o atual prefeito à reeleição.

As razões para sua saída, segundo Aloysio, foram muitas, a começar pela isenção do partido no segundo turno da eleição presidencial de 2022, que ele considerou errado. Mas a entrada de Datena também pesou nessa escolha:

— Ter uma candidatura própria é legítimo, como é legítimo fazer uma aliança com o Nunes ou com a Tabata. O que me parece ser uma atitude oportunista é escolher alguém que não tem nenhuma vinculação com a política do PSDB nem com uma política do campo democrático para representar uma eleição de uma cidade como São Paulo. Nada contra o Datena, mas ele não tem condições de representar o PSDB. Essa história de buscar uma celebridade política como uma folha de parreira para encobrir a inabilidade política já foi tentada várias vezes. Essas coisas nunca dão certo.

Quatro anos atrás, o PSDB elegeu Bruno Covas, neto do ex-governador Mário Covas, um dos mais admirados quadros do partido, com uma coligação composta por 11 partidos. Um “tucano de berço”. Em 2024, o cenário não poderia ser mais diferente: se a escolha Datena der jogo, o partido corre o risco de ir para as urnas sozinho, já que a maioria dos partidos de centro-direita se aliou a Nunes, enquanto o campo da centro-esquerda está com Guilherme Boulos (PSOL).

Tabata Amaral (PSB) bem que tentou se aliar aos tucanos, mas como cabeça de chapa. Foi a deputada quem indicou que o apresentador do ‘Brasil Urgente’ entrasse no ninho tucano, mas ele desistiu de ser seu vice ao almejar protagonismo maior. Ela ficou em silêncio tentando não queimar as pontes com o tucanato pois ainda acredita na possibilidade de reversão, mas não lidou bem com a traição, segundo pessoas próximas disseram ao GLOBO.

A avaliação de quadros que restam, como Aécio Neves, é de que se o nome é forte por si só, recursos e coligações ficam em segundo plano — o caso de Rodrigo Garcia, que perdeu o governo de São Paulo mesmo tendo a máquina em sua mão em 2022 é usado como argumento.

Mas o partido também chega a junho, quatro meses antes do pleito, com um cenário de desorganização interna. Perdeu todos os vereadores da Câmara Municipal da capital após a insistência em uma candidatura própria em vez de se aliar a Nunes. Outra reclamação foi justamente a demora para definir as chapas e organizar as campanhas para os Legislativos municipais. O prefeito de Santo André, Paulo Serra, que preside o diretório estadual, soma 120 pré-candidatos a prefeitos no estado. Um número pequeno considerando que os tucanos já chegaram a efetivamente governar 180 cidades paulistas em 2020.

Perillo reforçou o tamanho da expectativa do PSDB sobre Datena, para recuperar o prestígio que a sigla teve com Fernando Henrique Cardoso, Aloysio Nunes, Mario Covas, José Serra, Arthur Virgílio e Geraldo Alckmin — alguns deles longe do tucanato atualmente. Segundo ele, a filiação do apresentador “mexeu com o brio de todo o PSDB no Brasil”. Para Aécio, o partido jamais conseguirá construir sua caminhada se não estiver “forte no berço” que é São Paulo, onde o partido nasceu. Datena provocou qualquer insinuação da morte da sigla.

— Eu gostaria de convidar as pessoas que estão falando do funeral do PSDB pro funeral de vocês — falou.

Em 2022 e 2020, Datena enterrou sua candidatura em 30 de junho, ao aparecer na televisão para apresentar seu programa na Band, o prazo limite definido pela Lei Eleitoral para que as emissores deixem de transmitir programas comandados por pré-candidatos. Em 2018, até se afastou do cargo, mas em julho desistiu. Serão semanas apreensivas para os tucanos — e agora, sobre a sua decisão pesa também o futuro de um partido.


Fonte: O GLOBO