Maduro e seus adversários dizem estar certos de uma vitória, o que prenuncia um cenário pós eleitoral profundamente delicado e desafiador para países como o Brasil

Porto Velho, Rondônia - Esta semana, o governo do presidente venezuelano Nicolás Maduro convocou embaixadores estrangeiros em Caracas, entre eles a embaixadora do Brasil, Glivânia Maria de Oliveira, para uma reunião no Ministério das Relações Exteriores do país. 

O objetivo do encontro, relataram ao GLOBO fontes diplomáticas latino-americanas, foi apresentar aos embaixadores pesquisas que mostram uma ampla vantagem de Maduro na eleição presidencial do próximo domingo, e pedir que os representantes diplomáticos evitem “surfar na onda do já ganhou da oposição liderada por María Corina Machado”.
 
Na Venezuela, os dois lados em disputa gritam aos quatro ventos sua certeza de vencer a eleição. A guerra de narrativas acontece em meio à outra guerra, a das pesquisas, na qual a grande maioria aponta o favoritismo do opositor Edmundo González Urrutia, cuja campanha é organizada e comandada por María Corina, a figura política mais forte e influente da oposição venezuelana.

Com esse pano de fundo, o chanceler Iván Gil e a vice-presidente, Delcy Rodríguez, disseram aos embaixadores, segundo as fontes consultadas, que seus governos devem considerar todas as pesquisas, e não excluir as que indicam uma vantagem de Maduro. 

No encontro, as autoridades do governo chavista apresentaram uma pesquisa da Hinterlaces, instituto dirigido pelo consultor Oscar Schemel, na qual o presidente aparece em primeiro lugar, com 54,2% dos votos, contra 21,1% de González Urrutia. 

As pesquisas que circulam no mundo opositor mostram um cenário diametralmente oposto, no qual o diplomata aposentado que acabou se tornando a esperança da oposição após 25 anos de governos chavistas tem entre 20% e 40% de vantagem em relação a Maduro.

Para algumas fontes, o tom do chanceler e da vice foi “duro”, para outras apenas “enfático". Mas o recado foi dado: o chavismo acha que tem altas chances de vencer o pleito e espera que a comunidade internacional esteja aberta à essa possibilidade e, principalmente, não apoie um eventual não reconhecimento do resultado que será divulgado pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) por parte de seus opositores.

O convencimento entre os chavistas de que Maduro será reeleito e, com o mesmo grau de convicção, de que esse eventual triunfo será questionado pela oposição, explica a irritação do chefe de Estado venezuelano com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em Caracas, setores do chavismo estão furiosos com Lula por um motivo central: não ter exigido também à oposição que respeite o resultado que será dado pelo CNE. 

De acordo com uma fonte chavista, “Lula errou ao se referir apenas a Maduro e sua obrigação de reconhecer o resultado, e não dizer nada sobre a oposição”. Pela mesma razão, o ex-presidente da Argentina, Alberto Fernández, que fora convidado para observar o processo eleitoral, foi desconvidado pelo governo venezuelano. Em sua conta na rede X (ex-Twitter), o ex-presidente argentino informou sobre a decisão do governo venezuelano e relacionou essa decisão a declarações feitas a meios de comunicação argentinos, que foram na mesma linha de Lula.

Na oposição, ninguém sequer cogita a possibilidade de uma derrota de González Urrutia. Durante sua última caravana no interior do país, na cidade de Maracaibo, estado Zulia, María Corina disse ao GLOBO que “a única maneira de que Maduro ganhe a eleição é fazendo uma fraude gigantesca”.

— Em nossas projeções mais conservadoras, Edmundo tem 20% de vantagem. Vamos ganhar esta eleição e se o CNE anunciar outro resultado será porque houve fraude — afirmou a líder opositora.

Já o candidato agradeceu as palavras de Lula:

— O que presidente Lula tem dito é muito importante, muito importante.

Mas no mundo opositor existe um fator central para que os números de suas pesquisas possam se tornar realidade: a participação eleitoral. Dirigentes opositores reconhecem que será necessária uma avalanche de votos para que González Urrutia seja eleito, e para que essa avalanche aconteça será necessário driblar obstáculos já normalizados no país, entre eles a dificuldade de locomoção, as pressões do chavismo sobre servidores e pessoas beneficiadas por programas sociais, e o controle rigoroso das bases chavistas, nas quais, coincidem analistas, a decepção poderia levar muitas pessoas a migrarem para a oposição. Pela primeira vez em 25 anos, aponta o analista Ociel López, “o desgaste do governo Maduro permitiu que setores populares reconhecessem a liderança de uma pessoa da elite”, em referência à María Corina.

Aos embaixadores, jornalistas e aliados, Maduro e seus colaboradores dizem que esta será uma eleição histórica e que vão derrotar, mais uma vez, os inimigos da autoproclamada revolução bolivariana. A mesma mensagem está sendo dada diretamente a governos estrangeiros, entre eles o dos Estados Unidos, com o qual Maduro retomou o diálogo recentemente. Analistas locais com acesso ao mundo chavista afirmam que o presidente já exigiu ao governo americano que reconheça o resultado que será comunicado pelo CNE. As mesmas fontes afirmaram que nas conversas os EUA têm dito ao governo venezuelano que consideram muito difícil, talvez impossível, uma vitória de Maduro.

O presidente venezuelano não admite falar em possibilidade de derrota, como tampouco o admite María Corina. Os discursos de ambos prenunciam um cenário pós eleitoral profundamente delicado, no qual países como Brasil, Colômbia e EUA terão um papel crucial. Isso explica, em grande medida, a decisão de Lula de enviar a Caracas seu assessor internacional, Celso Amorim. 

Segundo fontes do governo brasileiro, “Lula quer mostrar quão importante a eleição da Venezuela é para o Brasil”. A questão será em que condições estarão as relações bilaterais quando Amorim e seus colaboradores aterrizarem em Caracas, na próxima sexta-feira ou sábado. Por enquanto, os que comemoraram as declarações de Lula são María Corina e González Urrutia.


Fonte: O GLOBO