Ministro é contra ampliação da prerrogativa, mas determinou abertura de inquérito no Supremo mesmo após saída de ex-auxiliar de Lula do governo; entenda por quê

O ministro André Mendonça, durante sessão do STF — Foto: Antonio Augusto/STF/05-09-2024

Porto Velho, Rondônia - Apesar de ter determinado a abertura de um inquérito para apurar as acusações de assédio moral e sexual contra o ex-ministro dos Direitos Humanos Silvio Almeida, o ministro do Supremo Tribunal Federal André Mendonça tem dado sinais de que não pretende votar pela ampliação do foro privilegiado para ex-ocupantes de cargos públicos no julgamento que será retomado nesta sexta-feira (20).

Mendonça foi quem interrompeu o julgamento da questão em abril deste ano com um pedido de vista e será o primeiro a votar quando a discussão for retomada.

O STF já tem maioria de seis votos (são 11 ministros) a favor da ampliação do foro. Gilmar Mendes, Cristiano Zanin, Flávio Dino, Dias Toffoli, Alexandre de Moraes e o presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, consideram que o foro deve valer para casos que envolvam uma autoridade que é investigada por crimes cometidos no exercício do mandato e em razão do cargo, mesmo quando ela já deixou o posto – como é o caso de Silvio Almeida.

Mendonça, porém, não concorda e pretende votar para que o atual entendimento não seja ampliado, o que empurraria o caso Silvio Almeida para a primeira instância, se o seu entendimento pessoal prevalecesse.

Mas, segundo a equipe da coluna apurou, o ministro preferiu acolher a posição defendida pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e o entendimento da maioria do STF, por isso autorizou a abertura do inquérito contra Silvio Almeida.

Até a decisão de Mendonça, a expectativa na Polícia Federal era que a posição do ministro no caso do ex-ministro dos Direitos Humanos antecipasse sua posição sobre o tema, o que não deve ocorrer.

De acordo com interlocutores do ministro no meio jurídico, a abertura do inquérito também foi uma forma de preservar as vítimas e agilizar as investigações. Isso porque se ele se guiasse apenas pelo próprio entendimento – que já está de antemão derrotado no Supremo – e despachasse o caso para um juiz de primeira instância, o caso fatalmente acabaria voltando para o STF quando o julgamento da questão acabar. Isso poderia atrasar o desfecho e prejudicar a continuidade das investigações.

Julgamento no plenário virtual

O julgamento sobre o alcance do foro privilegiado vai ser retomado nesta sexta-feira no plenário virtual do STF, uma plataforma digital que permite que os ministros depositem seus votos sem que os magistrados precisem se reunir presencialmente e sem as transmissões ao vivo da TV Justiça. Ele deve durar uma semana.

Além de Mendonça, ainda devem se manifestar os ministros Edson Fachin, Luiz Fux, Nunes Marques e Cármen Lúcia.

Em 2018, o Supremo reduziu o foro para os crimes cometidos no exercício do mandato e em razão do cargo. Mas no julgamento iniciado em abril deste ano – e ainda não concluído –, o tribunal formou maioria para ampliar o foro, incluindo os crimes que envolvam autoridades investigadas por crimes cometidos no exercício do mandato e em razão do cargo, mesmo quando ela já deixou esse cargo depois.

O STF analisa simultaneamente dois casos concretos que tratam do foro por prerrogativa de função, ambos sob a relatoria de Gilmar Mendes.

Um deles é uma questão de ordem que discute se a Corte é a instância competente para julgar a ex-senadora Rose de Freitas (MDB-ES) por supostos crimes cometidos durante o seu mandato ou se o inquérito deveria ser remetido à primeira instância, já que ela não foi reeleita.

O segundo gira em torno de um habeas corpus apresentado pelo senador Zequinha Marinho (Podemos-PA), que pede para levar ao STF uma ação penal a que responde na Justiça Federal do DF por um suposto esquema de rachadinha em seu gabinete quando era deputado federal. Eles negam as acusações.

“É necessário avançar no tema, para estabelecer um critério geral mais abrangente, focado na natureza do fato criminoso, e não em elementos que podem ser manobrados pelo acusado (permanência no cargo)”, defendeu Gilmar Mendes.

Para Gilmar, a sua proposta “estabiliza o foro”, “ao mesmo tempo que depura a instabilidade do sistema e inibe deslocamentos que produzem atrasos, ineficiência e, no limite, prescrição”.

A questão também interessa a Jair Bolsonaro, que já viu pedidos de investigação relacionados à sua atuação na Presidência da República serem enviados à Justiça Federal do Distrito Federal após o fim do seu mandato.


Fonte: O GLOBO